Acho que um dos principais motivos de dores de cabeça para quem trabalha com softwares de Sistemas de Informações Geográficas (SIG) são as projeções e
data cartográficos (
datum no plural se escreve
data, pois vem do latim).
A relação interdisciplinar forte que existe entre a Cartografia e o Geoprocessamento é o espaço geográfico. Para representar processos que ocorrem num espaço geográfico precisamos da Cartografia e o Geoprocessamento trata e analisa, geralmente dento de um SIG, estes mesmos processos dentro do espaço geográfico.
Também percebo que um dos principais motivos para esta dificuldade é a falta de conhecimento da grande parte dos usuários sobre os conceitos básicos da Cartografia. Isso se deve principalmente pela densidade de termos, matemática e teoria por trás de tais conceitos.
Porém utilizá-los de forma errônea pode complicar o andamento do seu projeto...
Tentarei explicar tais conceitos de maneira resumida e intuitiva, mas ressalto que vou ignorar alguns pontos pertinentes do assunto, pois meu objetivo é passar a essência.
1 - Forma da TerraDefinir a
forma da Terra é o primeiro passo, porém defini-la não é uma tarefa fácil. Sua composição é heterogênea e precisa ser matematicamente descritível, em outras palavras, descrita através de fórmulas, sistemas matemáticos e afins.
Desta forma, utiliza-se dois parâmetros: o campo gravitacional da Terra e a média do nível da água dos mares. Com esses dois dados, cria-se a superfície equipotencial gravitacional, em outras palavras, uma superfície onde a gravidade tem o mesmo valor em todos os seus pontos, mais próxima ao nível de água médio dos mares, formando o que chamamos de
geóide.
A técnica de inferência do
geóide esbarra na limitação do conhecimento do campo gravitacional da Terra. Conforme este conhecimento aumenta devido a evolução das técnicas e acurácia dos instrumentos, cria-se versões mais atualizadas do
geóide terrestre.
Fora a definição resumida, o que vale ressaltar é que existe uma diferença entre a forma da Terra real e o
geóide, isto é, existe no processo um erro inerente que não é constante para toda a superfície terrestre.
2 - Elipsóide de revolução e DatumA forma matemática do
geóide é intricado, o que dificulta uma série e aplicações práticas. Desta forma, cria-se na Cartografia uma versão mais simplificada do mesmo, o
elipsóide de revolução. Só para constar, o círculo está para a esfera como a elipse está para o
elipsóide.
Tal
elipsóide de revolução é definido essencialmente por dois parâmetros: (1) raio equatorial, isto é, o raio da Terra na linha do equador; e (2) grau de achatamento dos pólos.
Nesse ponto entra o
datum planimétrico. O
datum planimétrico é composto por um conjunto de parâmetros, onde na prática são: (1) o elipsóide de revolução; e (2) um ponto de referência terrestre, isto é, o ponto de "amarração" do elipsóide à Terra.
Além do
deste datum, também temos tipo de
datum menos utilizado nos
softwares de SIG, o
datum vertical ou altimétrico. Este
datum é uma superfície de referência baseada no nível médio dos mares. Ele só se faz necessário a dados que contenham informações de elevação como, por exemplo, um
mapa hipsométrico.
Cada país adota um
datum planimétrico e um
datum vertical que melhor represente seu território, isto é, melhor se aproxime da realidade da fração do globo terrestre correspondente ao seu território. Sendo assim, temos diversos
data para diferentes regiões do globo. Se, por exemplo, utilizarmos o
datum planimétrico oficial da China para representarmos o território da Colômbia, teremos uma grande distorção. Para aumentar ainda mais a quantidade de
data existentes, os instrumentos e técnicas se aprimoram, gerando novas versões mais acuradas de
geóides [como dito anteriormente],
elipsóides, pontos de "amarração" dos elipsóides e nível médio dos mares. Obviamente esses novos parâmetros geram versões de
data oficiais atualizados em cada país com o passar do tempo.
O Brasil já possuiu dois
data planimétricos oficiais:
Córrego Alegre e
SAD 69. Atualmente o Brasil está num período de transição para o
SIRGAS 2000, o novo
datum planimétrico oficial. Além disso, muitos dados do nosso território são encontrados também no
datum WGS 84. O
datum vertical oficial no Brasil é o
Imbituba, Santa Catarina e difilmente encontra-se dados geográficos brasileiros em outro
datum vertical.
Em breve colocarei um
post sobre a reprojeção entre esses
data.3 - Sistemas de coordenadas geográficasAgora que vimos que no SIG a forma da Terra é definida através de
data planimétricos e
verticais, precisamos definir um sistema de coordenadas para referenciar nossas informações.
Existem algumas maneiras de referenciarmos coordenadas no
elipsóide de revolução, mas certamente a mais utilizada são as
coordenadas geográficas. No link no final do
post aborda as outras formas na página 6-6.
As coordenadas geográficas são referenciadas por dois ângulos: o latitudinal e o longitudinal. O ângulo latitudinal é em relação à linha imaginária do equador e o ângulo longitudinal é em relação à linha imaginária de
Greenwich. Veja a figura abaixo:
4 - Projeções cartográficasReferenciar suas coordenadas no globo utilizando o sistema de
coordenadas geográficas pode ser limitado para inúmeras ferramentas do SIG como, por exemplo, medir distâncias e cálculo de área. Desta forma, realizamos a projeção do nosso
elipsóide de revolução num plano.
O problema é que não há como realizar o processo de projeção sem deformações. Determinadas técnicas de
projeções cartográficas geram determinados tipos de deformações. Então é de suma importância a escolha correta da projeção, dependendo da finalidade do dado geográfico a ser projetado. Por exemplo, a projeção
Cônica Conforme de Lambert deforma áreas, portando não podemos realizar cálculos envolvendo áreas em dados geográficos nessa projeção, pois o resultado obviamente não será preciso.
No link no final do
post aborda os tipos de projeções com mais detalhes e contém uma tabela com as principais
projeções cartográficas e suas características quanto às deformações na página 6-14. O que vale ressaltar aqui é que precisamos prestar atenção no tipo de projeção que utilizamos para determinadas finalidades.
4.1 - Projeção UTMA projeção
UTM - Universal Transverse Mercator é um das mais utilizadas em escalas 1:250.000 e maiores, pois suas características são pertinentes a estas escalas: preserva ângulos e a deformação de áreas não ultrapassa a 0,5%.
Todavia, ela tem uma característica peculiar entre as outras projeções, a projeção
UTM divide a terra em fusos ou zonas. Cada fuso contém 6º de longitude, então a Terra contém 60 fusos (360º/6º). Além disso, geralmente dividimos na prática cada fuso nos hemisférios (norte e sul). Associamos a cada fuso um número, que começa no anti-meridiano de
Greenwich, isto é, na longitude -180º, de oeste para leste. Também é comum associarmos a letra "S" ou "N" para referência o hemisfério. O Brasil é abrangido pelo fuso 18 até o 25.
É importante considerar os limites dos fusos na hora de escolher a projeção
UTM no seu projeto. Não podemos, por exemplo, representar dados contidos no fuso 18S no fuso 19S, pois isso obviamente resultaria em erro. Às vezes também nossa área de estudo pode ser abrangida por dois fusos, como é o caso do Estado do Rio de Janeiro, que é abrangido pelo fuso 23 e 24. Nesses casos precisamos adotar outra
projeção cartográfica ou customizar os parâmetros do fuso UTM, o que torna necessário um bom conhecimento do assunto por parte do usuário e gera incompatibilidade com outros dados geográficos.
5 - Conclusão
Como foi visto, temos vários
data e projeções cartográficas. Temos um grande número de combinação de ambos. É importante sabermos escolher qual
datum e qual o sistema de projeção utilizar (ou não utilizar) para que as respectivas deformações não deteriorem os resultados desejados. Recomendo olhar a tabela de projeções na página 6-14 do link no final do
post.
Ressalto que o processo de projeção é opcional, podemos representar o espaço geográfico desejado com coordenadas geográficas no
datum escolhido. Porém não utilizar um sistema de projeção limita a possibilidade de uma série de operações no SIG, principalmente envolvendo distâncias e áreas.
Bem, queria mostrar para vocês "sucintamente" (imaginem se fosse de forma completa) os conceitos que envolvem a Cartografia e Geoprocessamento. Ter esses conceitos na cabeça ou pelo menos a mão pode fazer grande diferença ao nosso projeto de SIG.
Existe um ótimo material sobre o assunto no capítulo 6: Cartografia para Geoprocessamento, do livro Introdução à Ciência da Geoinfomação. Todo este livro está disponível gratuitamente neste
link, o capítulo 6 está
neste.
Abçs e até a próxima...